Neste caso especifico o contribuinte que tem residência fiscal em Portugal e também tem a sua habitação própria e permanente está, desde janeiro de 2018, a trabalhar na Suíça e aí aufere a totalidade dos seus rendimentos, sendo tributado nesse país.
Na situação em análise é colocada a questão sobre os procedimentos declarativos a adotar no caso de um sujeito passivo que possui dupla residência fiscal (Portugal e Suíça). No caso em concreto, o sujeito passivo está desde janeiro de 2018 a viver na Suíça, no entanto, nunca procedeu a alteração da morada, pelo que, continua com a residência fiscal em Portugal.
Comecemos por nos referir ao conceito de residente, que consta do artigo 16.º do Código do IRS. Efetivamente, de harmonia com o disposto no n.º 1 do artigo 16.º do Código do IRS:
«(…) 1 – São residentes em território português as pessoas que, no ano a que respeitam os rendimentos:
a) Hajam nele permanecido mais de 183 dias, seguidos ou interpolados, em qualquer período de 12 meses com início ou fim no ano em causa;
b) Tendo permanecido por menos tempo, aí disponham, num qualquer dia do período referido na alínea anterior, de habitação em condições que façam supor intenção atual de a manter e ocupar como residência habitual;
c) Em 31 de dezembro, sejam tripulantes de navios ou aeronaves, desde que aqueles estejam ao serviço de entidades com residência, sede ou direção efetiva nesse território;
d) Desempenhem no estrangeiro funções ou comissões de carácter público, ao serviço do Estado Português.
2 – Para efeitos do disposto no número anterior, considera-se como dia de presença em território português qualquer dia, completo ou parcial, que inclua dormida no mesmo.
3 – As pessoas que preencham as condições previstas nas alíneas a) ou b) do n.º 1 tornam-se residentes desde o primeiro dia do período de permanência em território português, salvo quando tenham aí sido residentes em qualquer dia do ano anterior, caso em que se consideram residentes neste território desde o primeiro dia do ano em que se verifique qualquer uma das condições previstas no n.º 1.
4 – A perda da qualidade de residente ocorre a partir do último dia de permanência em território português, salvo nos casos previstos nos n.ºs 14 e 16.»
Esta norma, vigente em território nacional deve ser analisada para efeitos de determinação da residência fiscal neste país, ou seja, verificados estes critérios a Autoridade Tributária e Aduaneira tem legitimidade para considerar este contribuinte como residente em território nacional.
O artigo 19.º da Lei Geral Tributária (LGT) estabelece a obrigatoriedade de comunicação da alteração da residência fiscal. Para o efeito transcrevemos o disposto nos números 3 e 4 do artigo 19.º da LGT, que estabelecem:
«(…) 3 – É obrigatória, nos termos da lei, a comunicação do domicílio do sujeito passivo à administração tributária.
4 – É ineficaz a mudança de domicílio enquanto não for comunicada à administração tributária (…).»
Assim, a obrigação de comunicação de alteração de residência é do sujeito passivo residente em território nacional, que altera a sua morada para a Suíça.
Inclusive, terá sido aditado pela Lei n.º 82.º-E/2014, de 31 de dezembro, o n.º 5 ao artigo 19.º da LGT, que estabelece «(…) sempre que se altere o estatuto de residência de um sujeito passivo, este deve comunicar, no prazo de 60 dias, tal alteração à administração tributária (…).»
Para a questão colocada importa atender às duas regras de tributação previstas nos números 1 e 2 do artigo 15.º do Código do IRS:
«(…) 1 – Sendo as pessoas residentes em território português, o IRS incide sobre a totalidade dos seus rendimentos, incluindo os obtidos fora desse território.
2 – Tratando-se de não residentes, o IRS incide unicamente sobre os rendimentos obtidos em território português (…).»
Os sujeitos passivos residentes em território nacional são tributados pela regra da universalidade ou de base mundial, segundo a qual, as pessoas residentes são tributadas pela totalidade dos rendimentos obtidos, incluindo os obtidos no estrangeiro.
Os sujeitos passivos não residentes em território nacional são aqui tributados, de acordo com a regra da territorialidade, pelos rendimentos aqui obtidos. Para o efeito, no n.º 1 do artigo 18.º do Código do IRS são enumeradas as diversas situações que se configuram como rendimentos obtidos em território nacional, apenas estes rendimentos quando obtidos por não residentes são aqui tributados.
De acordo com a alínea a) do n.º 1 do artigo 18.º do Código do IRS consideram-se obtidos em território português «(…) os rendimentos do trabalho dependente decorrentes de atividades nele exercidas, ou quando tais rendimentos sejam devidos por entidades que nele tenham residência, sede, direção efetiva ou estabelecimento estável a que deva imputar-se o pagamento (…).»
A definição de residência é feita unilateralmente por cada Estado. As convenções internacionais sobre dupla tributação (CDT) aceitam tal competência, limitando-se a estabelecer regras de “desempate” que permitem qualificar um contribuinte como residente em apenas um dos Estados contratante, quando ambos (por força das divergências entre as respetivas leis) o consideram como tal.
O Decreto-Lei n.º 716/74, de 12 de dezembro aprovou a convenção entre Portugal e a Suíça para evitar a dupla tributação e estabelecer regras de assistência administrativa recíproca em matéria de impostos sobre o rendimento.
O artigo 4.º deste acordo, que se refere quanto à residência fiscal, estabelece que:
«1 – Para efeitos desta Convenção, a expressão «residente de um Estado Contratante» significa qualquer pessoa que, por virtude da legislação desse Estado, está aí sujeita a imposto devido ao seu domicílio, à sua residência, ao local de direção ou a qualquer outro critério de natureza similar. Relativamente à Suíça, a expressão «residente de um Estado Contratante» significa igualmente as sociedades em nome coletivo e em comandita simples constituídas ou organizadas segundo o direito suíço.
2 – Quando, por virtude do disposto no n.º 1, uma pessoa singular for residente de ambos os Estados Contratantes, a situação será resolvida de acordo com as seguintes regras:
a) Será considerada residente do Estado Contratante em que tenha uma habitação permanente à sua disposição. Se tiver uma habitação permanente à sua disposição em ambos os Estados contratantes, será considerada residente do Estado contratante com o qual sejam mais estreitas as suas relações pessoais e económicas (centro de interesses vitais);
b) Se o Estado contratante em que tem o centro de interesses vitais não puder ser determinado ou se não tiver uma habitação permanente à sua disposição em nenhum dos Estados contratantes, será considerada residente do Estado contratante em que permanece habitualmente;
c) Se permanecer habitualmente em ambos os Estados contratantes ou se não permanecer habitualmente em nenhum deles, será considerada residente do Estado contratante de que for nacional;
d) Se for nacional de ambos os Estados contratantes ou se não for nacional de nenhum deles, as autoridades competentes dos Estados contratantes esforçar-se-ão por resolver o caso de comum acordo.»
No caso exposto, é fundamental determinar a residência do sujeito passivo. Se estivermos perante um sujeito passivo residente em território nacional, então, sendo aqui abrangido pela regra da universalidade deverá aqui declarar a totalidade dos rendimentos obtidos. Neste caso, os rendimentos que aufere no estrangeiro devem ser declarados no anexo J.
Se estivermos perante um não residente que obtém rendimentos de trabalho dependente pagos por uma sociedade suíça, não há lugar a tributação, nem qualquer obrigação declarativa decorrente dessa operação em território nacional.
Se efetivamente o sujeito passivo alterou a sua residência fiscal para a Suíça (deixou de cumprir as condições previstas no artigo 16.º do Código do IRS) então, deve comunicar essa alteração de residência à Autoridade Tributária e Aduaneira.
Se o sujeito passivo não comunicou a sua alteração de residência para a Suíça (junto da Autoridade Tributária e Aduaneira) e possui dupla residência, então, ambos os países possuem legitimidade para tributar, pelo que devem ser utilizadas as condições previstas no artigo 4.º do acordo internacional para o “desempate”.
Em caso de litígio, nomeadamente se a dupla residência vier a materializar-se em liquidações adicionais de IRS em Portugal, referimos que está disponível um mecanismo de resolução de litígios em matéria fiscal regulado pela Lei n.º 120/2019, de 19 de setembro.